Uma Europa em Construção
No dia em que este Visto for publicado, poderemos dizer: ontem foi o Dia da Europa! Nem de propósito. Dias depois de a Comissão Europeia ter anunciado os princípios que presidirão ao próximo quadro financeiro plurianual, onde consta uma possível descida do valor dos programas comunitários que têm atribuído a Portugal montantes de fundos muito significativos.
Naturalmente, o país político reagiu. As organizações associativas de natureza económica e social, também. Por questões eleitorais, por interesses de classe, todos levantaram a voz. O que terá levado os autores de “elias, o sem-abrigo”, a tira humorística do JN, a ironizar no passado dia 6, que “Por uma vez, o governo, os partidos, os patrões e os sindicatos estão de acordo - a união europeia tem de alargar os cordões â bolsa”. Não é habitual tanta unanimidade na sociedade portuguesa.
Mas o Dia da Europa não é isso. Porque a União Europeia não é só isso.
O Dia da Europa comemora a paz e a unidade e assinala o aniversário da «Declaração Schuman», feita há 68 anos atrás. Comemorar a paz, nestes dias que correm, merece destaque especial. Mas a paz constrói-se todos os dias. Mesmo numa Europa que, por vezes, parece ter esquecido as duas guerras sangrentas em que se envolveu no século passado. A guerra nas proximidades deste Velho Continente. A guerra dos ataques inesperados, cegos, terroristas. A guerra que alguns governantes declaram aos refugiados de outras guerras. Sem humanismo, sem sentido solidário de espécie alguma. A guerra que não permite um pouco de esperança aos que já perderam toda a esperança numa vida digna. Tudo isto nos lembra, deve lembrar, o 9 de maio, em cada ano.
Dia que também comemora a unidade. De que unidade se pode falar, agora?
Unidade também deve ser sinónimo de coesão, de atenuação de disparidades, de desigualdades. E que vimos nós nos anos de crise? Que, aliás, se vai sentindo, ainda agora, em que a crise, parece, vai atenuando as suas marcas. E as mazelas que provocou aos mais vulneráveis? Pois… Por isso é que não se compreende muito bem que a proposta da Comissão Europeia faça diminuir as verbas para a coesão em 7%. E atenção! As verbas para a Política Agrícola Comum também diminuem. Apareceram notícias, talvez para iludir pessoas menos atentas, que as verbas que diminuem no pilar do desenvolvimento rural podem ser atenuadas pela possibilidade de concorrer ao Horizonte Europa, uma designação esquisita para as verbas destinadas à pesquisa e inovação. No caso, na alimentação, agricultura, desenvolvimento rural e bioeconomia. Pasme-se com esta invenção! Estamos mesmo a ver os agricultores portugueses da agricultura familiar a concorrerem a esses programas. Daí que sejamos levados a perguntar: por onde anda a “solidariedade de facto” que consta da Declaração Schuman?
Estas interrogações não desvalorizam a abertura ao público, por estes dias, de várias instituições europeias para que os cidadãos conheçam melhor esta Europa em contínua construção.